Aqui há umas semanas saiu um artigo no New York Times sobre a importância das crianças crescerem com uma forte narrativa familiar. A conclusão é baseada num estudo que incidiu sobre várias famílias e crianças norte-americanas, e a conclusão foi: quanto mais os miúdos sabem sobre a sua história familiar, maior é a sensação de controlo que têm sobre as suas vidas, e os índices de confiança em si e na família.
Para tornar as coisas mais interessantes, os autores distinguem entre três tipos de narrativa: a narrativa ascendente, a descendente e a oscilante. A ascendente é a do “ começámos do zero e hoje somos espectaculares, portanto não estragues tudo”*. A descendente é a oposta, “perdemos tudo o que tínhamos, portanto a bitola já não está muita alta, é difícil fazeres pior”. E a oscilante é aquela que se baseia num “a nossa família já teve muitos altos e baixos, teve filantropos, caloteiros e pessoas que se colam ao carro da frente na auto-estrada, mas manteve-se sempre unida para resistir a todas as adversidades”.
De acordo com o estudo, a narrativa oscilante é aquela que dá melhores resultados. Reforça a sensação de que pertencemos a alguma coisa maior que nós, e é um sinal de famílias saudáveis, que comunicam efectivamente entre si e assumem os problemas como desafios.

Desde pequeno que me lembro de ouvir histórias de família que encaixam perfeitamente nesta definição de narrativa oscilante. Ou eram antepassados que foram membros distintos da sociedade (ou simplesmente boas pessoas, que ainda é mais importante), ou tetra-qualquer-coisa-malucos que andavam pelo Chiado a fugir aos maridos das amantes e a estoirar dinheiro em casinos. E nunca tinha pensado bem nisto, mas é verdade que estas personagens, estas histórias, reforçaram muito a sensação que eu tenho de pertença familiar. E isto não tem nada a ver com o tamanho da família ou a quantidade de quinquilharia que se tem nas paredes.
Se tudo correr bem, daqui a muitos anos alguém vai dizer algo deste género “e tiveste um tio que tinha um blog, chamado da paisana, ou algo género, onde tentava fazer piadas com a paternidade e sei mais o quê… demorou tempo, mas felizmente a família lá conseguiu ultrapassar isso, e hoje podemos voltar a sair à rua de cabeça levantada.” “O que é um blog?”. “Não interessa, mas eram tipo os pasquins dos séc. XIX”.
*ao contrário do que acontece nos Estados Unidos, há, em certas franjas da sociedade portuguesa, um desprezo pelo fenómeno de “começar do zero”. Neste caso a narrativa ascendente também pode assumir a forma de “a partir do momento em que apareceu a vida na Terra fomos apontados por um poder superior como sendo uma família melhor que as outras, portanto não estragues tudo”.
tudo ok, à excepção da palavra “narrativa”… está mais ou menos proibida eheheheheheheheheh
Mas se deixar de usar a palavra… é porque eles ganharam! :->
Oscilante rules. Tenho de começar a tomar notas. Sou a tua Padawan.
Ahahah. No fundo, também ando aqui a tirar notas. E a dizer parvoíces, ok.
Também considero que a sensação de pertença, união, partilha é muito importante para o equilíbrio. Saber que houve gerações que lutaram e sobreviveram a épocas difíceis (a maioria no carreiro, outros, não) também dá alento.
E serões e almoços a ouvir histórias? Muito bom. Só tenho pena que os anciãos estejam a partir…