Notas da pandemia

Mais vale escrever isto assim, do que deixar uma série de posts em rascunho que só ficarão prontos para publicar na próxima vaga pandemia.

  • Se pudesse escolher, a melhor altura da minha vida para ter ficado em confinamento pandémico teria sido provavelmente o ano de 2007. Partilhava uma casa no centro de Lisboa onde tinha duas assoalhadas e uma casa-de-banho só para mim, a um preço pré-Airbnb, e tinha uma Wii e um fígado altamente funcional.
  • em teoria, o confinamento seria o sonho de qualquer introvertido com ligeiras tendências antissociais, excepto se esse introvertido viver numa casa de 100m2 com três crianças e um cão (e mais um ser humano espectacular, de quase infinita paciência).
  • embora esteja casado com um ser humano espectacular, de quase infinita paciência, é inevitável que surja o ocasional conflito doméstico-pandémico. Um dos mais espectaculares resultados destes conflitos doméstico-pandémicos foi a “sopa de ódio”. A “sopa de ódio” é uma espécie de Sopa da Pedra, mas, em vez de assentar num calhau figurativo-real, a base da sopa de ódio são acusações primárias do género: “não te vejo a fazer nada por esta casa”. “Ai, não me vez a fazer nada por esta casa? espera lá que já te digo!”. Três horas depois estão três tupperwares de sopa a arrefecer no balcão da cozinha.
  • A sopa era boa, tão boa, tão cheia de vitaminas, que até a bebé foi diagnosticada com excesso de beta caroteno.
  • Nas primeiras semanas de pandemia tive a brilhante ideia de ler vários artigos que descreviam, na primeira pessoa, a experiência de ser uma pessoa adulta que não pertencia a um grupo de risco e que passou duas semanas em coma num hospital com um tubo enfiado pela garganta abaixo e alucinações várias induzidas por um coma induzido.
  • Depois de várias viagens de elevador a suster a respiração e muitas mãos lavadas, deixei de ler artigos desse género.
  • Uma das rotinas de ligação com o mundo exterior que se mantiveram entre o mundo pré e pós pandémico foram os passeios do cão, no novo normal não sei se me teria mantido minimamente normal se esses passeios (que deixaram de ser dele, e passaram a ser nossos).
  • Novo normal é uma expressão estúpida, porque nada disto é normal, nem nada disto será duradouro. Poderá sair um novo normal a partir disto, mas não é isto, porque isto não vai durar para sempre.

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