Combater o Bullying – mudar percepções

Li no babble há uns dias uma notícia sobre uma criança de 12 anos ter morrido no seguimento de um ataque de bullying. Um miúdo americano, que teve de ser posto em coma, depois de ter sido esmurrado várias vezes na cara, cair e sofrer um traumatismo craniano, acabou por falecer.

A ideia da vulnerabilidade de um filho, nas várias dimensões em que um pai é impotente para intervir, é uma das sensações mais difíceis com que tenho lidado depois de ser pai. Pior até que ele fazer diarreia e acertar nos meus sapatos novos. Claro que é importante aceitar que não vamos poder proteger sempre os nossos filhos, o que, desconfio ser um aspecto determinante no crescimento de crianças saudáveis, independentes e equilibradas – e a manutenção das mesmas qualidades nos pais -,  mas também é verdade que os pais (em conjunto com outros agentes) têm um papel importante na criação de condições para ter filhos mais felizes e saudáveis.

O bullying é um dos fenómenos mais assustadores, assim à distância, porque aos 5 meses não me parece que ele possa ser bullied, porque é real e frequente, e tem lugar no mundo da criança que existe longe dos pais, seja na escola, no recreio, ou na rua, podendo assumir muitas formas e graus de intensidade, todos eles com o potencial de deixar marcas a nível psicológico e/ou físico.

Para lidar com bullying, e do pouco que tenho lido de pessoas que lêem e sabem mais do que eu, a confiança parece ser um dos pilares fundamentais na maneira da criança encarar e resolver o problema. Ainda assim, qualquer um que já foi gozado, agredido ou provocado, sabe que os bullies da vida real não desaparecem à primeira resposta confiante, como nos filmes, ou com um pontapé à Karate Kid (na minha escola era provável que um miúdo que se pusesse em pose de gafanhoto fosse logo chinado). Muitas vezes eles voltam com força redobrada, psicoses inflamadas e, não raramente, com outros amigos.

Imagem universal para bullies, nos anos 80.
Imagem universal para bullies dos anos 80.

Há outra frente de combate ao bullying que me parece importante reforçar. A percepção sociocultural.

Lembro-me perfeitamente de me dizerem para nunca aceitar doces de estranhos. Não sei se nos anos 70 houve uma epidemia de estranhos a oferecer doces a crianças (que sorte?), mas é verdade que todas as crianças com que eu cresci eram obcecadas por não se aceitar doces de estranhos. Também é verdade que nunca ninguém viu um estranho a oferecer doces, mas a regra, a percepção existia. Existia porque foi martelada na cabeça dos miúdos, através dos pais, da televisão, dos livros, etc. Como nos anos 90 alguém decidiu martelar na cabeça dos pais que a rua era perigosa, e agora não se vê miúdos sozinhos a brincar na rua.

Não me lembro de nada com essa intensidade sobre bullying. Tirando os super-heróis de banda desenhada (o Homem-Aranha é o exemplo canónico, mas há outros), e além dos clichés do filme em que o nerd ou aprende a lutar e dá uma lição aos bullies (yeah, right), ou começa a namorar com a miúda mais popular (yeah, riiiiiight) , não é um assunto muito explorado.

OK, na fase emo do homem-aranha (Spiderman 3), ele bem que merecia levar uns calduços.
OK, quando, no terceiro filme, ele entra naquela fase emo / gótica, bem que merece levar uns calduços.

As sugestões que o artigo do babble faz são pertinentes, e algumas delas vão neste sentido. Mas acho que devíamos trabalhar muito esse aspecto da dimensão cultural, que é, sobretudo, um desafio de comunicação. Quer sejam pais de miúdos bullied, bullies ou normais, em casa, e na escola, deve criar-se uma cultura onde esses os episódios de bullying sejam denunciados e isolados. Não só para quem sofre, mas também para que faz – muitas vezes são crianças ainda com mais problemas. Tem de se reforçar o sentimento de comunidade, uma comunidade que protege os seus e defende os mais fracos dos mais fortes. Envolver os pais na vida da escola, conceber estratégias de comunicação criativas, levar a mensagem a diferentes meios e suportes. Não sei se isto já está a ser feito, mas do alto da minha torre de armado em esperto  não vejo nada.

Claro que não há mal nenhum numas escaramuças ou galhardetes ligeiros entre miúdos. Lembro-me de episódios de bullying na minha infância (um miúdo gorducho, timído, sem jeito para o desporto, só faltava ter um alvo nas costas), e outros em que me lembro de ser gozado, sem trazer grande mal ao mundo. Mas há limites que não se devem passar, e os miúdos costumam ter noção desses limites, sobretudo quando eles são ultrapassados. Não vai resolver o problema, mas pode começar a fazer parte de uma solução.

Para terminar deixo um projecto artístico sobre bullying do Shane Koyczan. Poderoso.

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9 Comments

  1. também já dei comigo a pensar no mesmo e o mexicano cá de casa também só tem 7 meses. eu sou aquela que acha que vai dar a mão para ajudar o filho a atravessar a estrada até ele ter 20 anos. Como é que vou conseguir lidar com fatores externos, como é que se lida com o que não se controla? *medo*

  2. É das coisas que mais me aflige, sobretudo por ouvir casos próximos em que as crianças escondem o que se está a passar. Ser criança e viver com um fardo destes é impossível! E eu que sou tão mãe-galinha! 🙁

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