Assim que sai uma notícia sobre bullying aparece sempre um tipo de comentador de jornal que não perde tempo em partilhar connosco a sua brilhante – e muito original – opinião sobre o assunto.

O argumento é algo do género (normalmente apresentado com mais exclamações):
“Estamos a criar uma geração de tótós! O bullying é importante, porque as crianças têm de aprender como é o mundo real!”

Curiosamente é uma linha de argumentação muito próxima de um dos argumentos base dos defensores da praxe académica, como instrumento de humilhação (disfarçada de integração):
“a praxe serve para preparar os caloiros para a vida depois da Universidade”

Só posso tentar imaginar o que se passará na cabeça destas pessoas. Como será o seu dia-a-dia?
Que tipo de obstáculos encontram no seu quotidiano?
Será que foram pessoas que cresceram rodeadas de amor, bondade e carinho, e que depois fracassam redondamente em vários (ou todos) aspectos da vida, tipo realização pessoal, dinheiro, trabalho? Ou pessoas que foram abusadas e cresceram como vítimas, mas que mais tarde singraram na vida, compraram um t3 e têm uma carrinha TDI, e agora associam qualidade importantes, como a resiliência e a capacidade de lidar com conflitos, com ser alvo de agressões físicas e psicológicas diárias?
Ou tiveram simplesmente uma infância triste e querem que outras pessoas também tenham infâncias tristes, para se sentirem menos miseráveis na própria tristeza?

São pessoas que chegam ao escritório e primeira coisa que o recepcionista lhes diz é: “bom dia, ó badocha, e vê lá se hoje andas para aí a fazer alguma coisa de jeito!”. E que levam galhetas no caminho para a máquina do café?

Eu sei que o bullying no trabalho é um problema muito grave. Já trabalhei com perturbados mentais que riscam carros ou furam pneus a colegas. E há sempre aquelas histórias de pessoas que, não raras vezes, acabam a chorar em casas-de-banho.

Mas será que a melhor forma de lidar com pessoas mesquinhas, cruéis e invejosas, é achar que não se deve lutar contra a crueldade sistemática nas escolas? Na infância?
É melhor que os nossos filhos sejam maltratados do que contribuir para que tenhamos crianças que não maltratem os outros? Será que o mundo não é já um lugar suficientemente mesquinho, aleatório e merdoso, para que não tentemos torná-lo num sítio um pouco menos merdoso?
É impossível viver sem que a realidade se encarregue de nos dar umas chapadas* nas trombas,
*ou um sinal de trânsito
E há de ser sempre assim. Mas ao menos devemos tentar que não seja por sistema.
A não ser que tenha piada inconsequente:
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