‘Star Wars – The Force Awakens’ não é um grande filme, mas está bem

Já passaram algumas semanas desde a estreia do último Star Wars – O Despertar da Força, mas ainda dou por mim pensar no filme. Eu sei que já ninguém tem muita paciência para ouvir que Star Wars é mais que um filme, que é fenómeno, estilo de vida, o que seja; mas acho que ainda continua a ser interessante pensar o filme, tanto no contexto Star Wars como no do cinema em geral.

Antes de mais, é importante dizer que Star Wars – The Force Awakens é um bom filme. E, além de ser um bom filme, é um bom filme Star Wars. Isto é importante porque, até há uns meses, o resultado geral entre filmes bons e filmes maus Star Wars estava empatado.

No geral, The Force Awakens é um filme divertido e competente. É dos melhores blockbusters da última década. Tem uma boa história, personagens com que vibramos e é visualmente arrebatador – que é o que se pede de um blockbuster. O filme avança com um bom ritmo. Explosões, perseguições e batalhas especiais entermeiam na perfeição com momentos humanos. A direcção de arte e os efeitos especiais, incríveis. Mais do que isso, depois do trauma generalizado das prequelas, é bom ver que as estrelas regressam mesmo grande ecrã. Os extraterrestres voltam a estar lá, as naves voltam a ser de metal, tudo ganha espaço e volume – até os sabres de luz.

star wars Finn lightsaber

Onde o filme brilha é na construção das personagens e interpretações. Não dos actores que regressam, mas sim dos três novos protagonistas. Há trinta anos que um episódios Star Wars não nos apresentava pessoas (ou seres) com quem nos conseguimos relacionar. Isto é mais importante do que parece, sobretudo em filmes que envolvem viagens no hiperespaço e dróides falantes.

E o vilão. Ter de suceder ao maior vilão de todos os tempos da história do Cinema é como ter de treinar o Inter de Milão depois do Mourinho ter ganhado tudo com a equipa – um trabalho que ninguém quer (mas que o Benitez aceita). Kylo Ren, o aparente fanboy de Darth Vader é uma das maiores vitórias do JJ Abrams neste filme. É um antagonista mais humano, mais vulnerável, menos impressionante visualmente, mas que aparece com uma dimensão psicológica que o antecessor não tinha (ao início) – outro resultado da combinação de uma notável interpretação e de um bom guião.

E, claro, há o factor nostalgia. É especial, regressar ao Universo Star Wars no grande ecrã. Reconhecer a Millenium Falcon. Voar ao lado da voz do Han Solo e os rugidos do Chewbacca. Tudo junto, vale bem os 10 euros que custam os bilhetes para uma sala IMAX (mais pelo tamanho do ecrã do que pelo 3D). Como experiência de entretenimento, das melhores coisas que vi no ano passado.

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E tem uma das melhores protagonistas femininas de um blockbuster, a par do Mad Max: Fury Road.

Mas não é um grande filme. Não é um grande filme por várias razões.

Cinematograficamente, não tem nenhum rasgo de originalidade, nem traz nada de novo ao género. Ah, mas é só um blockbuster. Sim, mas o Jaws e o Jurassic Park também eram, mas são filmes que arriscam, que têm uma cinematografia com profundidade e ideias sobre o que o cinema pode ser. Ah, mas o JJ Abrams não é o Steven Spielberg. OK, portanto podemos parar de dizer que o JJ Abrams é o novo Spielberg?

E depois há a questão da originalidade do filme. Ou da falta dela.

Star Wars – The Force Awakens existe ali fronteira da sequela que é ao mesmo tempo uma homenagem, do remix, do remake e do reboot. É o filme perfeito da pós-pós modernidade – e talvez possa ser considerado original nesse sentido.

Era mesmo necessário que um novo filme Star Wars que recicla uma série de artefactos dos originais (dróides que desaparecem num planeta deserto, uma protagonista com uma sensibilidade especial para a força e instintos de piloto que mora num planeta deserto, outra estrela da morte, um bando de rebelde que luta contra um império do mal, etc.)? Para conquistar fãs novos? Para agradar a fãs existentes? Claro que não.

Force Awakens tie fighter pilot

A ideia de que o filme é feito para agradar aos fanboys é muito irritante. O estado de fanboy só deve durar só até ao crawl das letras iniciais. Quando passa aquele arrepio de ouvir o tema do Star Wars, quero ser surpreendido, quero ouvir coisas novas. Uma coisa é ir a um concerto de orquestra a tocar a banda sonora dos filmes, outra coisa é ir ver um filme ao cinema.

Isto não torna o filme mau, mas torna-o menos especial. Não há ideias novas sobre realmente novas sobre os conflitos, a Força, e outras mitologias da Galáxia. O universo não fica maior, nem mais distante (os planetas são todos cópias genéricas de planetas que já vimos antes), e mesmo as ideias novas que aparecem são pouco (ou nada) desenvolvidas. A resistência parece continuar no mesmo sítio. O Império também (continua a construir empreendimentos megalómanos e mortíferos, pelo menos).

The Force Awakens toca bem nos centros de prazer nostálgico, como o trailer já fazia. Mas tem alguma dificuldade em conseguir surpreender-nos para lá disso. Ou porque não quiseram (ou conseguiram) ir mais longe. Poderá ser um problema de expectativas? A tarefa impossível de competir com um filme que uma criança viu nos anos 80?

A competência do filme prova que não. Não é um problema de expectativas – é um problema de ambição criativa. Muito para lá dos filmes, sempre houve histórias incríveis no universo Star Wars. Nos jogos, nos livros. Nas mãos do realizador certo, por exemplo, o enredo do jogo Knights of the Old Republic (KoTOR) podia dar um filme tão bom como o Empire Strikes Back. 

Portanto, é possível. Quero mesmo acreditar que é possível que voltemos a ter um grande filme Star Wars no cinema, mas não é este.

De qualquer maneira, podemos ficar satisfeitos porque voltámos a ter um bom filme Star Wars. Não sei se termos a máquina da Disney a martelar um filme Star Wars por ano, até ao fim da civilização, é bom ou mau, mas se levarmos em conta o exemplo da Universo Cinematográfico Marvel, podemos esperar coisas boas (e outras assim-assim). E o episódio VIII vai ter um realizador diferente, que também vai escrever o guião. O Rian Johnson, do Looper. Esperemos que nos leve para bem mais longe.

Hiperespaço

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